sábado, 22 de novembro de 2008

ACABAR COM A FOME MUNDIAL. É POSSÍVEL!!!

"Sim, é importante acabar com a pobreza, pôr fim à miséria, mas a coisa mais importante é dar o poder ao povo para que ele possa combater por si mesmo.

Teoricamente, é muito simples acabar com a fome mundial. Mas pôr isso em prática está longe de ser simples. Em primeiro lugar, é preciso reconhecer o direito a uma dieta saudável e variada como um direito humano básico que sem dúvida é. Os governos têm que se empenhar em acabar com a fome do seu povo e têm que implementar acções eficazes para pôr em prática esse empenhamento. Em muitos países, mesmo neste momento, há suficiente comida armazenada para alimentar toda a população com um alto nível de nutrição. Isto, claro, é sobretudo evidente nos Estados Unidos, onde se produzem tantos alimentos. É um verdadeiro crime que haja tantos pobres nos Estados Unidos com fome, subnutridos, ou que não saibam de onde virá a sua próxima refeição (o que só por si tem um preço psicológico) quando há tanta abundância de alimentos.

A curto prazo, é necessário que a situação de emergência de fome e subnutrição cada vez mais grave seja contrariada com todos os recursos à disposição de cada país. Embora a distribuição maciça a granel de cereais ou de leite em pó possa desempenhar um papel importante, os países deviam reflectir sobre a inovação venezuelana de instalar casas alimentares em todos os bairros pobres. Quando as pessoas acreditarem que o governo está realmente a tentar ajudá-los, e lhes confere poderes para encontrarem ou ajudarem numa solução para os seus próprios problemas, verificar-se-á uma explosão de entusiasmo e de voluntariado. Por exemplo, embora os alimentos no programa de alimentação da Venezuela sejam fornecidos pelo governo, as refeições para as crianças pobres, para os mais velhos e para os doentes são preparadas e distribuídas a partir das casas do povo com base em grande quantidade de trabalho voluntário. Além disso, a Venezuela instituiu uma rede de lojas que vendem alimentos básicos com descontos significativos em relação aos preços marcados nos supermercados privados.

O Brasil iniciou um programa em 2003 que se destina a aliviar as condições das pessoas mais pobres. Cerca de um quarto da população do Brasil recebe pagamentos directos do governo nacional, ao abrigo da Bolsa de Família, um programa anti-pobreza. Ao abrigo deste programa, uma família com uma receita per capita abaixo de 2 dólares diários por pessoa, recebe um subsídio que pode ir até aos 53 dólares por mês por pessoa ( The Economist, 7/Fevereiro/2008). Esta infusão de dinheiro está dependente de as crianças da família frequentarem a escola e participarem no programa nacional de vacinação. Este programa evidentemente está a ter um efeito positivo na vida e na alimentação das pessoas. Mas é um sistema que não tem o mesmo efeito dos programas da Venezuela, que mobiliza as pessoas para trabalharem em conjunto para seu próprio benefício e em benefício da comunidade.

Os jardins urbanos têm sido utilizados com grande êxito em Cuba e noutros países para fornecer os moradores da cidade com alimentos e também como fonte de receitas. Isto devia ser amplamente fomentado – com a utilização criativa do espaço disponível em aglomerados urbanos.

A agricultura tem que tornar-se a primeira prioridade do terceiro mundo. Até o próprio Banco Mundial está a começar a realçar a importância de os governos ajudarem a agricultura nos seus países. Como afirmou a Dra. Ngozi Okonjo-Iweala, directora-geral do Banco Mundial.

Actualmente, a atenção dos políticos mundiais está virada para o desastre do subprime e para as crises financeiras. Mas a verdadeira crise é a da fome e da subnutrição… este é o verdadeiro problema que devia atrair a atenção mundial. Sabemos que 75 por cento das pessoas pobres em todo o mundo são rurais e a maioria delas depende da agricultura para viver. A agricultura é hoje, mais do que nunca, um instrumento fundamental para combater a fome, a subnutrição e como apoio ao desenvolvimento sustentado e à redução da pobreza (All-Africa Global Media, 19/Fevereiro/2008).

Quase todos os países do mundo têm solo, água e recursos climatéricos para produzir alimentos suficientes para que todo o seu povo possa alimentar-se com uma dieta saudável. Além disso, já existe na maior parte dos países o conhecimento e as variedades de cultivo de modo que, se for prestada aos agricultores uma assistência adequada, estes poderão conseguir colheitas razoavelmente altas.

Embora seja essencial uma produção agrícola melhorada, no passado tem sido dado principal realce à produção de culturas para exportação. Mas se bem que isso possa equilibrar a balança de pagamentos de um país, a agricultura orientada para a exportação não garante alimentos suficientes para toda a gente nem promove um ambiente rural saudável. Para além dos produtos básicos, como seja a soja, a agricultura orientada para a exportação também leva naturalmente à produção de cultivos de luxo de alto preço procurados pelos mercados de exportação (luxos na perspectiva das necessidades alimentares básicas de um país pobre do terceiro mundo), em vez dos cultivos de subsistência de baixo preço necessários para satisfazer as necessidades da população doméstica. A produção de quantidades suficientes dos tipos de alimentos correctos dentro das fronteiras de cada país – por pequenos agricultores trabalhando em cooperativas ou por sua própria conta e usando técnicas sustentáveis – é a melhor maneira de atingir a meta da "segurança alimentar". Só assim pode ser protegida a população, pelo menos parcialmente, das flutuações de preços no mercado mundial. Isto, evidentemente, implica também não retirar terras à produção alimentar para produzir cereais para os mercados dos biocombustíveis.

Uma das formas de fazer isto e, em simultâneo, de acabar com o problema de tanta gente amontoada nos bairros de barracas urbanos – as pessoas mais susceptíveis às subidas dos preços alimentares – é proporcionar terras através de reformas agrárias significativas. Mas a terra só por si não basta. O início do regresso de agricultores precisa de apoio técnico e financeiro para a produção de alimentos. Adicionalmente, é preciso desenvolver sistemas de apoio social, como cooperativas e conselhos comunitários, para ajudar a promover a camaradagem e a solidariedade nas novas comunidades que se forem desenvolvendo. Provavelmente cada comunidade precisará de ser "semeada" com alguns activistas dedicados. Também será necessário disponibilizar habitação, electricidade, água e esgotos para atrair as pessoas que vivem na cidade a mudarem-se para o campo. Uma outra forma de encorajar as pessoas a mudarem-se para o campo e passarem a ser agricultores é apelar ao patriotismo e difundir a ideia de que eles são verdadeiros pioneiros, instituindo um novo sistema alimentar para ajudar os seus países a conquistar uma auto-suficiência alimentar, i.e., a independência das empresas transnacionais agroindustriais e o abastecimento de alimentos saudáveis para toda a população do país. Estes agricultores pioneiros precisam de ser encarados por si mesmos, pelo resto da sociedade e pelo seu governo como imprescindíveis para o futuro dos seus países e para o bem-estar da população. Têm que ser tratados com o maior respeito que merecem.

Conclusão
A alimentação é um direito humano e os governos têm a responsabilidade de providenciar para que o seu povo seja bem alimentado. Além disso, há formas conhecidas para acabar com a fome – incluindo medidas de emergência para combater a actual situação crítica, jardins urbanos, reformas agrárias que incluam todo um sistema de apoio aos agricultores, e técnicas agrícolas sustentáveis que promovam a qualidade do ambiente. A actual disponibilidade de alimentos para as pessoas reflecte relações de poder económicas e políticas muito desiguais dentro e entre os países. Um sistema alimentar sustentável e seguro exige uma relação diferente e muito mais equitativa entre os povos. Quanto mais os pobres e os próprios agricultores forem incluídos em todos os aspectos dos esforços para conquistar a segurança alimentar, e quanto mais forem motivados para esse processo, tanto maior será a probabilidade de atingir uma segurança alimentar duradoira. Como afirmou o Presidente Hugo Chavez da Venezuela, um país que tanto tem feito para combater a pobreza e a fome:
Sim, é importante acabar com a pobreza, pôr fim à miséria, mas a coisa mais importante é dar o poder ao povo para que ele possa combater por si mesmo."

Do mesmo autor:
A explosão da dívida e a especulação , 05/Nov/06 [*]
Professor aposentado de ciência das plantas e dos solos da Universidade de Vermont em Burlington e director da Fundação Monthly Review. O original encontra-se em http://monthlyreview.org/080501magdoff.php . Tradução de Margarida Ferreira.

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/

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