CONCLUI QUE A POLÍTICA AGRÍCOLA DEITA POR TERRA OS ESFORÇOS DE PROTECÇÃO DA NATUREZA NA EUROPA
Domingos Leitão - SPEA (16-07-09)
No início desta semana a Comissão Europeia (CE) publicou os resultados de um exercício para avaliar o estado do património natural nos 27 Estados Membros. Usando dados fornecidos pelos governos, este relatório analisa a situação de centenas de habitats e mais de um milhar de espécies de plantas e animais protegidos pela Directiva Habitats da União Europeia (EU).
Apesar de algumas melhorias, graças a acções e projectos específicos de conservação da natureza, o relatório salienta que a UE quase de certeza irá falhar o objectivo para 2010 de estancar a perda de biodiversidade. Particularmente ameaçados estão os ecossistemas agrícolas, as zonas húmidas e a orla costeira. Apenas 17% das espécies e dos habitats mais importantes da UE viram o seu estatuto de conservação melhorado.
A SPEA e a BirdLife International, que têm desenvolvido projectos significativos para conservação da biodiversidade, aplaudem a CE por este relatório demolidor e consideram particularmente importante o enfoque especial no papel da agricultura em todo este processo: Konstantin Kreiser, responsável da BirdLife para as Políticas da UE comenta que “temos agora a prova definitiva de que a Política Agrícola Comum (PAC) continua a ser uma das ameaças principais para a natureza e a biodiversidade na Europa”. O relatório mostra que os habitats dependentes da gestão agrícola e agro-florestal estão particularmente ameaçados, quando comparados com outros (apenas 7%, comparativamente a 21%, possuem uma situação favorável). As pastagens extensivas e os pousios, habitats muito importantes para a natureza, estão particularmente ameaçados pela intensificação e pelo abandono agrícola.
As conclusões da CE coincidem com a evidência científica recolhida pela parceria BirdLife International (incluindo a SPEA) sobre o declínio das aves dos meios agrícolas. Em Portugal 50 espécies de aves dependentes dos ecossistemas agrícolas e agro-florestais encontram-se ameaçadas. Algumas estão mesmo em perigo crítico de extinção, como o Milhafre-real e o Rolieiro.
Domingos Leitão, Coordenador do Programa Rural da SPEA, não tem dúvidas em afirmar que “a responsabilidade desta falha na implementação de politicas e medidas adequadas é dos governos nacionais e dos Ministros da Agricultura”. Em Portugal, desde 2006 que a SPEA critica fortemente o Ministério da Agricultura devido à implementação deficiente do Plano de Desenvolvimento Rural (PDR). Falta investimento na Rede Natura 2000, em instrumentos financeiros que apoiem os agricultores que optam por práticas amigas da natureza. “O mais incrível é que o PDR Português foi aprovado em 2007 com a promessa do Ministro Jaime Silva de investir mais 50 milhões de euros em medidas agro-ambientais específicas para a Rede Natura 2000, e até à data nada foi feito” salienta Domingos Leitão. Um pouco por toda a UE os governos cedem aos poderosos lóbis agrícolas e, em vez de apoiar a agricultura sustentável, gastam o dinheiro da PAC na intensificação agrícola, como os projectos megalómanos de regadio. O relatório da CE é muito oportuno, considerando que começou recentemente o debate sobre a reforma radical da PAC, talvez a última hipótese de aplicação de verdadeiras medidas de apoio ao ambiente rural.
A BirdLife International e a SPEA consideram ainda escandaloso que passados 17 anos após a adopção da Directiva Habitats da UE ainda haja Estados Membros que alegam não conhecer o estatuto das suas espécies de plantas e animais mais importantes. Portugal é directamente visado nesta critica juntamente com Grécia e Espanha, que indicaram que desconhecem a situação de mais de 50% das suas espécies.
Domingos Leitão afirma que “este é o resultado de mais de uma década de desinvestimento na natureza, que levou ao desaparecimento dos programas de seguimento que existiam e a uma ignorância deliberada dos que foram criados”. A SPEA desenvolve quatro programas de seguimento de populações de aves, com base no trabalho de mais de 150 voluntários, coordenados por ornitólogos profissionais. Um desses programas, o Censo da Aves Comuns, apesar de fornecer informação estatística que Portugal tem de apresentar anualmente a Bruxelas, não tem qualquer apoio financeiro do Estado. Domingos Leitão confessa que “a SPEA tem colhido promessas do Ministério da Agricultura e do Ministério do Ambiente, mas ainda não recebeu um único euro pelos dados que recolhe, analisa e disponibiliza desde 2004”.Perante esta situação inaceitável a SPEA apela à CE que tome uma posição firme contra Portugal e outras Estados Membros, de modo a forçar os governos a investir mais no seguimento da biodiversidade.
Por último, a BirdLife e a SPEA, concluem que apesar dos bons instrumentos, como a Rede Natura 2000 e a Directiva Habitats, a UE e os governos nacionais têm falhado sistematicamente na reforma e implementação das políticas sectoriais relevantes. Como diz Konstantin Kreiser, “por esta razão este relatório não surpreende ninguém”. Mas a Europa não pode dar-se ao luxo de falhar novamente com a Biodiversidade. Para isso necessitamos de uma verdadeira reforma da PAC, que favoreça a natureza, o bem estar, a segurança alimentar e a prosperidade económica.
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